Cancro da bexiga

Cancro da bexiga (ou cancer da bexiga)

O que é cancro da bexiga?

 O cancro da bexiga é uma doença na qual as células normais que revestem o interior da nossa bexiga se transformam (carcinogénese) e se convertem em células cancerígenas. Estas células são diferentes das restantes, pois:

  • Possuem uma rápida capacidade de se multiplicarem (divisão celular);
  • São imortais (não obedecem aos normais processos de morte celular programada);
  • O seu crescimento é descontrolado e desordenado, apresentando capacidade para migrarem e se alojarem noutros órgãos à distância (metastização);
  • Possuem capacidade de invadir e destruir tecidos vizinhos;
  • Possuem capacidades próprias de escapar aos processos de defesa do organismo.

O tipo de célula que dá origem ao tumor define o nome do mesmo Por exemplo, no cancro urotelial da bexiga, também conhecido por carcinoma de células de transição, são células do urotélio/células epiteliais de transição (camada de revestimento interno da bexiga) que se transformam em células oncológicas.

O cancro da bexiga é a sétima neoplasia maligna mais comum do sexo masculino e a 11ª considerando os 2 géneros. Assim, estima-se que afete 3 a 4 vezes mais homens do que mulheres, embora se tenha verificado nos últimos anos uma diminuição desta proporção.

Nem todos os tumores da bexiga são malignos, sendo que cerca de 5% dos casos são tumores são benignos. Deste grupo fazem parte os papilomas, miomas, adenomas, etc..

Infelizmente, a grande maioria das neoplasias da bexiga são malignas, sendo a mais frequente o carcinoma urotelial vesical (também conhecido como carcinoma de células de transição). Outros exemplos de neoplasias malignas da bexiga são o carcinoma epidermoide da bexiga, também conhecido por carcinoma de células escamosas, o adenocarcinoma, de pequenas células, sarcoma, etc..

Diferença entre tumores benignos e malignos

O tumor benigno da bexiga, do qual já se apresentaram exemplos na secção anterior, representa cerca de 5% dos tumores da bexiga. Eles caracterizam-se pela sua capacidade de crescimento local, de modo algo organizado, revelando na maioria dos casos uma fraca capacidade de invasão dos tecidos da bexiga e tecidos circundantes. Os tumores benignos, como o nome indica, não possuem capacidade para metastizar para outros órgãos.

Em relação ao tumor maligno da bexiga (cancro), este caracteriza-se pela sua capacidade de invasão na superfície e profundidade dos tecidos da bexiga, crescimento localmente de modo desorganizado e infiltrando-se nas diversas camadas da bexiga e invadindo outros órgãos na vizinhança da bexiga e à distância.

A maioria dos tumores apresenta-se como pólipos ou nódulos protudindo no interior da bexiga, sendo na maioria das vezes identificados na ecografia da bexiga ou por cistosocpia (exame para ver através de uma câmara/cistoscópio o interior da bexiga). Existem também, mais raramente, tumores da bexiga planos e que só se identificam por cistoscopia e biópsia da bexiga.

Sinais e sintomas do cancro da bexiga

Os sinais e sintomas mais frequentes da neoplasia vesical são:

  • Hematúria – presença de sangue na urina (macroscopica ou microscópica);
  • Poliaquiuria – necessidade de urinar muitas vezes ao dia;
  • Urgência – necessidade imperiosa de urinar;
  • Disúria/alguria – dor ao urinar.

Estes sintomas iniciais são bastante inespecíficos e podem surgir em múltiplas condições diferentes como na patologia prostática, infeções urinárias, cálculos urinários, entre outras. Assim, na presença de algum destes sintomas deverá consultar o seu médico urologista (especialista em urologia).

Causas do cancro da bexiga

As principais causas / fatores de risco conhecidos para o carcinoma vesical são:

  • Tabaco – hábitos tabágicos são o fator de risco mais importante para o carcinoma da bexiga, estando presente em aproximadamente 50% dos casos;
  • Ocupação exposicional / ambiental a determinadas tintas, corantes, derivados do petróleo, metais, etc.;
  • História familiar de cancro da bexiga;
  • Ingerir água contaminada com arsénico;
  • Ingestão prolongada de chá contendo Aristolocha fangchi (erva chinesa);
  • Exposição a radiação ionizada (por exemplo, antecedentes de radioterapia pélvica);
  • Tratamentos anti-neoplásicos com determinadas drogas como ciclofosfamida ou ifosfamida;
  • Inflamação prolongada da bexiga, secundária a infeção por schistossomiase, algaliação crónica, litíase vesical, etc.;
  • Determinadas variações genéticas podem aumentar a suscetibilidade de desenvolver um cancro da bexiga se for exposto aos outros fatores de risco.

A etiologia está assim dependente de vários fatores de risco, dos quais o mais importante é o consumo de tabaco. Este contem diversas aminas aromáticas e hidrocarbonetos policiclicos que são excretados no sistema urinário e que predispõem à mutação das células e à sua transformação em células cancerígenas.

A predisposição familiar (hereditário) estará relacionada provavelmente a determinadas características genéticas que aumentam ou diminuem a capacidade do organismo se defender das agressões externas / agentes mutagénicos.

O sexo masculino (homens) é o mais atingido (3 a 4 x mais), apresentando uma provável relação com a maior proporção de hábitos tabágicos em comparação com o feminino (mulheres)

Diagnóstico do cancro da bexiga

Diferentes exames e procedimentos podem ser utilizados para estabelecer o diagnóstico de cancro da bexiga:

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Estadiamento do tumor

O cancro da bexiga pode ser dividido em 2 grandes categorias, consoante a profundidade da sua invasão na parede da bexiga, a saber:

  • Não músculo-invasivo, também conhecidos como superficiais;
  • Músculo-invasivo, também conhecidos vulgarmente por invasivos;

Também podemos subdividir os tumores consoante a sua agressividade e potencial para invasão em profundidade e à distância:

  • Baixo grau – geralmente menos agressivos e de melhor prognóstico;
  • Alto grau – geralmente mais agressivos e com maior potencial para invasão das várias camadas da bexiga e proliferar para outros órgãos.

A classificação de estadiamento adotada geralmente na comunidade Urológica é a classificação TNM aprovada pela União Internacional contra o Cancro (UICC), que estipula o seguinte (resumo):

  • T – Representa a invasão local do tumor primário;
  • Ta - Tumor papilar não invasivo (confinado ao urotélio);
  • Tis CIS – Carcinoma in situ (tumor plano de alto grau confinado ao urotélio);
  • T1 - O tumor invada a lamina propria;
  • T2 - O tumor invade o músculo da bexiga;
  • T3 - O tumor invade o tecido adiposo perivesical;
  • T4 - O tumor invade a próstata, o útero, a vagina, a parede pélvica ou a parede abdominal;
  • N - Indica se existe doença em g|anglios linfáticos;
  • M – Indica se existem metástases noutros órgãos.

Metástases no cancro da bexiga

Felizmente a maioria dos tumores da bexiga (75%) estão confinados às primeiras camadas da bexiga, ou seja, não invadem o músculo da bexiga, apresentando assim um bom prognóstico.

No entanto, existem alguns casos raros que se apresentam, na altura do diagnóstico, com metastização para outros órgãos ou localmente muito avançados.

Os locais de metastização mais comuns são inicialmente para os nódulos linfáticos e posteriormente para o fígado, o pulmão, o osso e o cérebro.

Cancro da bexiga tem cura?

O prognóstico da doença depende muito das características do tumor como o estadio no momento do diagnóstico / tratamento, do tipo de tumor, do grau de diferenciação e ainda de características do doente (presença de outras doenças, idade, estado geral, etc.).

Por norma, os tumores menos agressivos (baixo grau) e menos invasivos (Ta) apresentam um excelente prognóstico se tratados atempadamente e corretamente. Apesar da maioria destes doentes poder ser curado com cirurgias pouco agressivas e tratamentos intravesicais, a taxa de recorrência mantem-se alta, sendo necessária a vigilância periódica através de cistoscopia, citologia urinária e UroTC.

Por outro lado, os tumores localmente muito avançados (T4) e/ou com metastização ganglionar ou à distância acarretam um maior risco de morte devido a cancro. A maioria destes doentes necessita complementar o tratamento com recurso a quimioterapia ou imunoterapia sistémica, sendo as probabilidades de cura mais reduzidas.

Saiba, de seguida, como tratar o cancro da bexiga.

Tratamento do cancro da bexiga

O tratamento do cancro da bexiga vai depender do tipo de tumor, do estadio da doença e das características do doente. Existem diferentes tipos de tratamento no cancro da bexiga, a saber:

Cirurgia (ou operação)

  • Resseção Transuretral Vesical - RTU-V – Realizado através da uretra, permite a resseção do tumor da bexiga. Serve para diagnóstico histológico, tratamento paliativo e tratamento curativo, nomeadamente em tumores pouco agressivos;
  • Cistectomia radical – Remoção cirúrgica, seja por via aberta, laparoscópica ou assistida por Robótica, da bexiga e nódulos linfáticos. Normalmente são removidos também outros órgãos vizinhos (por exemplo próstata no homem e útero e ovários na mulher). Esta cirurgia é realizada normalmente em contexto de tumores agressivos que invadem as camadas mais profundas da bexiga, tumores muito volumosos ou que recidivam apesar de otimização das restantes alternativas terapêuticas. Também é uma possibilidade de tratamento com intuito paliativo, ou seja, para alivio dos sintomas. A remoção cirúrgica da bexiga implica que se tenha de reconstruir uma forma alternativa da urina sair, como por exemplo por neobexiga ou estoma urinário cutâneo (urina passa a sair por orifício no abdómen, diretamente para um saco coletor);
  • Cistectomia parcial – implica a remoção apenas da parte afetada da bexiga. Utilizada apenas em casos muito específicos.

Radioterapia

Utiliza radiação de alta-energia para matar as células cancerígenas ou prevenir o seu crescimento. Utilizada para tratamento paliativo de cancro da bexiga ou, no caso de intenção curativa, em conjunto com outras terapias, nomeadamente quimioterapia e cirurgia.

Quimioterapia

Utiliza agentes quimioterápicos (medicamentos ou remédios) que são responsáveis por matar as células cancerígenas ou impedir a sua proliferação. Pode ser utilizada por via sistémica ou por via local, através da instilação direta na bexiga. Por via local é utilizada normalmente em complemento à resseção transuretral da bexiga (RTU-V). Por via sistémica pode ser utilizada em contexto de complemento de terapias (por exemplo QT + cirurgia, ou Cirurgia + Radioterapia + Quimioterapia, etc.) ou em caso de doença metastizada.

Imunoterapia

Do mesmo modo que a quimioterapia, esta também pode ser realizada por via intravesical (ação local) ou por via sistémica. A imunoterapia atua utilizando as defesas do próprio sistema imunológico do individuo, promovendo assim o combate ao cancro. A imunoterapia utilizada por via intravesical, conhecida por BCG, atua estabelecendo uma reação inflamatória e imunológica na bexiga que atuará contra as células cancerígenas. Este tipo de tratamento está indicado para tratamento dos tumores localizados às camadas mais superficiais da bexiga.

Por outro lado, a imunoterapia sistémica está, à data, indicada apenas no tratamento da doença metastizada. Atualmente, este tipo de tratamento tem vindo a ganhar notoriedade, estando a ser realizados diversos ensaios clínicos multicêntricos em diferentes circunstâncias e estadios da doença.

Prognóstico no cancro da bexiga

O prognóstico depende muito das características da doença, do diagnóstico precoce e das características do doente.

Por norma, tumores pequenos localizados nas primeiras camadas da bexiga e com características histológicas pouco agressivas apresentam boas percentagens de cura, quando devidamente tratados e vigiados. Apesar disso, é importante recordar que o tumor da bexiga possui um grande potencial para a recidiva pelo que é fundamental manter uma vigilância regular no seu Urologista.

Por outro lado, na presença de doença localmente muito avançada ou metastizada, as percentagens de cura são dececionantes, sendo necessário recorrer na maioria dos casos a segundas e terceiras linhas terapêuticas para controlar a doença e aumentar a esperança de vida.

Por vezes, as características do próprio doente (estado geral debilitado, insuficiência renal, patologia cardíaca severa, ausência de condições anestésicas) podem limitar a atuação terapêutica (ausência de condições para a cirurgia ou para realizar o esquema necessário de quimioterapia ou imunoterapia), comprometendo assim a eficácia do tratamento.

Investigação, novos tratamentos no cancro da bexiga

Para o futuro estão em desenvolvimento diversos tratamentos inovadores, alguns dos quais já na fase de ensaio clinico.

Os grandes avanços científicos no cancro da bexiga têm-se verificado ao nível dos tratamentos sistémicos como a utilização da imunoterapia e em avanços tecnológicos na área da cirurgia (laparoscopia e cirurgia auxiliada por Robótica), permitindo um aumento da esperança de vida e um aumento importante em termos de qualidade de vida dos doentes.

Na área do seguimento (follow-up) e da genómica (estudo dos genes) também se têm verificado avanços relevantes que provavelmente aportarão novos princípios de vigilância e de orientação terapêutica num futuro próximo.

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