Comportamento alimentar

Patologias comportamento alimentar

O que são doenças do comportamento alimentar?

As doenças do comportamento alimentar são transtornos caracterizados pela existência de uma distorção no comportamento relacionado com a alimentação e/ou por comportamentos de controlo de peso. Esta distorção do comportamento alimentar, resulta numa alteração do consumo de alimentos afetando de forma significativa a saúde física ou o funcionamento psicossocial do indivíduo.

Para além destas alterações no comportamento alimentar, também podem ser identificadas outras manifestações, nomeadamente psicológicas, como distúrbios da imagem corporal e problemas de autoestima, que podem estar na origem e na manutenção destas doenças.

As doenças do comportamento alimentar estão entre as doenças psiquiátricas mais comuns, afetando cerca de 5% da população. Apesar da idade na qual a doença surge ser normalmente na adolescência / início da idade adulta, a idade pode variar dependendo da doença de comportamento alimentar, podendo afetar pessoas de todos os géneros, idades, raças, religião, culturas e peso corporal.

Classificação e caracterização das doenças de comportamento alimentar

As doenças de comportamento alimentar são classificadas de acordo com os critérios de diagnóstico do Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorder 5th edition (DSM-5). Neste manual estão descritos os critérios de diagnóstico para as diferentes doenças de comportamento alimentar, permitindo diferenciar os diferentes transtornos.

Caracterizadas por alterações graves no padrão alimentar, que podem afetar de forma significativa a saúde do indivíduo, as doenças do comportamento alimentar podem ser classificadas em:

  • Pica;
  • Perturbação de ruminação;
  • Perturbação de evitamento / restrição da ingestão alimentar;
  • Anorexia nervosa;
  • Bulimia nervosa;
  • Perturbação de ingestão compulsiva;
  • Perturbação do comportamento alimentar sem outra especificação.

Apesar das doenças de comportamento alimentar envolverem comportamentos alimentares não saudáveis nem todas têm impacto no peso.

Pica

A Pica é uma doença de comportamento alimentar caracterizada pelo consumo de substâncias que não são alimentos. As substâncias tipicamente ingeridas tendem a variar com o que existe disponível, sendo as mais comuns: papel, sabonete, tecido, cabelo, corda, lã, terra, giz, pó de talco, tinta, metal, pedras, carvão, cinza, argila, amido ou gelo.

Neste transtorno normalmente não existe uma aversão aos alimentos, sendo a idade mínima de diagnóstico os 2 anos e podendo estar associada a outros distúrbios psicológicos.

Perturbação de ruminação

A perturbação de ruminação é um distúrbio caracterizado pela regurgitação repetida dos alimentos após a sua ingestão. Os alimentos ingeridos e que podem estar parcialmente digeridos voltam à boca sem a ocorrência de náusea, vómito involuntário ou enjoo. A comida pode depois ser novamente mastigada e “cuspida” ou novamente engolida.

Este comportamento não se encontra associada a um distúrbio gastrointestinal ou uma condição médica.

Perturbação de evitamento / restrição da ingestão alimentar

Na perturbação de evitamento / restrição da ingestão alimentar o indivíduo consome quantidades de alimentos mais reduzidas e/ou evita determinados alimentos. Como consequência desta restrição alimentar pode existir perda de peso e/ou carências nutricionais.

A restrição alimentar pode dever-se a características sensoriais dos alimentos, como por exemplo, cor, textura, temperatura, cheiro ou sabor.

Esta é uma perturbação comum na infância, pelo que uma má nutrição pode ter implicações ao nível do crescimento e desenvolvimento.

Anorexia nervosa

A anorexia nervosa é uma doença de comportamento alimentar caracterizada por uma recusa e restrição alimentar motivada pela manutenção de um peso e uma imagem corporal considerada como ideal e consequente fobia de aumento de peso.

Esta restrição alimentar, com perda de peso associada, leva na grande maioria dos casos a uma desnutrição e a consequências graves para a saúde do indivíduo.

Associada à restrição alimentar podem existir outros comportamentos purgativos, com o mesmo objetivo, como por exemplo o recuso à utilização de laxantes ou exercício físico excessivo.

Bulimia nervosa

Na bulimia nervosa e, contrariamente à anorexia, o indivíduo apresenta episódios recorrentes de ingestão de alimentos de uma forma compulsiva, seguidos de comportamentos purgativos e compensatórios, de forma a prevenir o ganho de peso resultante da ingestão alimentar.

Entre os principais comportamentos purgativos incluem-se a indução do vómito, utilização de laxantes, clisteres, diuréticos ou pela realização de exercício físico excessivo.

Estes comportamentos são, por norma, realizados em segredo e com um sentimento de culpa associado, no entanto são recorrentes uma vez que permitem ao indivíduo aliviar a carga emocional associada ao episódio de ingestão alimentar compulsiva.

Perturbação da ingestão compulsiva

Tal como o nome indica na perturbação de ingestão compulsiva e, tal como acontece no caso da bulimia nervosa, existem episódios de ingestão de alimentos de uma forma compulsiva e descontrolada.

No entanto, ao contrário do que acontece na bulimia nervosa, nesta situação não existem comportamentos purgativos (como por exemplo: indução do vómito, toma de laxantes ou exercício físico excessivo) com o objetivo de eliminar o excesso de calorias, pelo que uma parte dos pacientes apresenta excesso de peso ou obesidade.

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Fatores de risco

As doenças do comportamento alimentar estão entre as doenças psiquiátricas mais comuns, no entanto não se conhecem as suas causas exatas. Existem vários fatores que podem influenciar o seu aparecimento, tais como fatores genéticos, psicológicos e sociais.

A evidência sugere que a genética pode ter um papel no facto de algumas pessoas terem um maior risco, no entanto as doenças de comportamento alimentar podem também surgir em pessoas sem história familiar destas doenças.

Ao nível psicológico, estas doenças ocorrem frequentemente em pessoas com história de outras patologias como perturbações de humor, ansiedade, depressão ou outros distúrbios psiquiátricos, como transtorno obsessivo compulsivo.

Na sociedade atual existe um grande foco e procura pela imagem de corpo ideal, existindo muitas vezes comentários negativos e sistemáticos em relação ao corpo do outro, o que numa pessoa com uma baixa autoestima pode influenciar a sua insatisfação com a imagem e aparência física e, assim, influenciar o surgimento de uma doença de comportamento alimentar.

Uma vez estabelecida, a doença de comportamento alimentar tende a manter-se, não se resolvendo por si só, sendo como tal essencial um diagnóstico o mais precocemente possível e um correto tratamento.

Tratamento das doenças do comportamento alimentar

O tratamento de uma doença de comportamento alimentar é complexo e moroso, pelo que um acompanhamento por uma equipa multidisciplinar com experiência no tratamento destas perturbações é essencial.

O plano de tratamento deverá ser sempre individualizado a cada pessoa e a cada doença, podendo incluir uma ou mais das seguintes abordagens:

  • Psicoterapia – individual, grupo e/ou família;
  • Avaliação e acompanhamento nutricional;
  • Medicação;
  • Avaliação e monitorização médica.

A abordagem nutricional depende sempre do tipo de doença alimentar na qual estamos presentes e, deve ser sempre individualizada às caraterísticas da doença e ao individuo.

No caso da anorexia e da bulimia, o tratamento ao nível nutricional passa pela recuperação do peso perdido, implicando uma mudança de comportamento, sendo o acompanhamento psicológico uma peça fundamental. Na consulta de nutrição é necessário traçar objetivos, que podem ir desde um aumento de 0,1kg a 0,5kg por semana e, como tal, é fundamental que exista uma relação de confiança entre o indivíduo e o nutricionista.

Perante uma doença de comportamento alimentar é necessário haver uma desmistificação de crenças sobre a alimentação e uma reeducação para hábitos alimentares saudáveis. No caso de existir uma restrição alimentar, é necessário aliar a reeducação alimentar com uma reintrodução alimentar progressiva, começando com alimentos considerados “seguros” pelo paciente.

Para além de ser essencial promover um bom estado nutricional e uma alimentação saudável, é essencial estabelecer uma boa relação do paciente com a alimentação e com o seu corpo.

As pessoas com uma doença do comportamento alimentar têm um risco aumentado de complicações médicas, pelo que um diagnóstico precoce irá influenciar a evolução e tratamento da doença.

Como tal, quanto mais cedo existir um diagnóstico confirmado mais atempadamente será iniciado um tratamento específico e, consequentemente melhor será o prognóstico.

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